segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Cotidiano

Queria te dizer que por aqui tudo vai bem. Ou mais ou menos bem. Ainda não sei bem.

Aquela camisa que você esqueceu eu doei. É que passou por aqui um senhor franzino, de olhos bem azuis e pele queimada pelo sol. Fazia frio, ele pediu comida e quando eu ia levar o prato vi sua blusa no braço do sofá, dei a ele. Fazia bastante frio. No seu aniversário te compro outra. Eu sei que você adorava aquela, porque era vermelha e quentinha, mas já estava desbotada. Te dou uma preta. Você fica lindo de preto.

Finalmente resolvi levar a sério aquele projeto de ser alguém na vida. Tenho estudado o máximo e dormido o mínimo possível. Concordo, sempre fui preguiçosa e dorminhoca, mas tenho vivido a base de café e coca-cola. Pois é, justo eu que detesto refrigerante. A celulite tem aumentado um pouco, já que a promessa da academia só está sendo adiada. Um sonho de cada vez. E você também sempre disse nunca se importar com isso.

Parou de beber? acho que você está mentindo. Sempre que diz isso está. Eu não. Na verdade nem quero. Demorei a aprender, vai que novamente perco o costume? na verdade não sei que costume. No máximo um ou dois copinhos já fazem efeito, já que o tempo para a "vida social" está cada vez mais escaço.

Estou de mudança. Ganhei um banheiro só meu e agora posso deixar meus brincos em cima da pia, deixar a escova de dentes no copinho sem ter medo que você usufrua dela e entupir a bancada de cremes, shampoos e o que mais eu tiver vontade sem que você  me acorde pela manhã com a sua sinfonia ao derrubar ao menos uns cinco potes.

Ah! comprei uma saia daquelas que você gosta. E não venha com seus típicos trocadilhos, obviamente não disse que você gosta de usar. Mas daquelas poucas que te fazem me elogiar. Apesar da cor meio duvidosa, é daquelas que quando a menina é criança adora ficar rodando pra ver a saia ficar redondinha. Eu ainda insisto que saias abaixo do joelho são a cara da minha avó, e não a minha, mas eu gosto de elogios, ainda mais vindos de você, que são tão raros.

Ontem o vento derrubou o nosso porta retrato e o vidro rachou. Minha mãe veio aqui hoje e disse que era pra eu trocar a foto ou o vidro, porque atrai azar. Pensei comigo: "ainda dá pra ficar pior?". Não se preocupe, eu não contei nada pra ela. Eu sei que você não suporta os palpites dela. As vezes até eu me irrito, mas claro que eu nunca te disse isso. Não vou dizer pra você nunca que minha mãe está errada e o certo é você.

Eu não contei pra ela a falta que me faz você derrubar os cremes, ou eu pedir pra você trocar o moletom vermelho-desbotado-quase laranja. Ou te olhar abotoar a calça, com o cinto desafivelado, ao mesmo tempo calçar o sapatenis (que eu adoro) e ajeitar o cabelo, todo afobado pra gente chegar na hora que meu pai marcou. Eu não disse que eu observava tudo aquilo admirada e rindo do seu jeito desengonçado de se arrumar e me apressar. Eu não contei que você não reclama mais daquela touca de banho rosa bebê horrorosa que eu usava pra gente tomar banho e você não molhar meu cabelo. Acho que você tentava sempre de proposito, só porque eu detesto dormir de cabelo molhado e você gostava de se aproximar de mim e sentir o cabelo gelado encostar em você até você dormir.

Eu não comentei com ela que não tenho mais como pedir pra você parar de fumar, lembrar de separar suas "monocelhas" e comer antes de uma noite de bebedeira. Eu não contei que eu ainda rezo por você todas as noites.

Um comentário:

Sofia disse...

A vida como ela é.